Patinho Branco

terça-feira, 14 de julho de 2009

Uma vez criança, sempre criança



Quando era criança, lá pelos cinco anos, ganhei de aniversario uma bicicleta de duas rodas, que para mim, era igualzinha a do meu tio, uma Peugeot, semiprofissional, linda, azul claro, que comprara de segunda mão de um corredor profissional, mas muito bem conservada. Um sonho de bicicleta, que mesmo nos anos seguintes, continuou nova na mão dele, apesar de usa-la constantemente.
Com muito custo, aprendi a andar na minha bicicleta, que veio com aquelas rodinhas de apoio, que eu já insistia para que meu pai tirasse, porem não havia meio de convence-lo.
Depois de algum tempo de muita insistência, ele concordou , e esse foi o meu passaporte para sair à rua. Foi meu tio quem me convidou para passear de bicicleta com seus amigos ciclistas, que todo final de semana saiam para pedalar pelas redondezas.
Fique muito orgulho por ter recebido o convite, apesar de ter achado o passeio muito rápido. Sabe como é criança, ganha a mão e quer o braço.
A minha paixão por bicicletas nasceu nesse dia e nunca mais consegui viver sem pedalar, mas é bom que se diga, sempre nas bicicletas dos outros, já eu nunca conseguia ter a minha.
A primeira que ganhei de aniversario, depois foi desmontada pelo meu pai, já que eu sumia pelas ruas com ela. Um dia sai de manhã, sem avisar ou pedir autorização, e voltei horas depois, já bem á tarde no finzinho do dia. Essa foi a gota d’água.
Alguns anos depois, ainda criança, começo de adolescência, resolvi com meu dinheirinho, montar minha própria bicicleta, já que devido aos fatos passados, eu não conseguia mesmo convencer o meu pai a me comprar uma.
Passei a freqüentar o Ferro Velho e as bicicletarias do bairro, sempre a procura uma ou outra peça sucatada que eu pudesse aproveitar. Assim no decorrer de um tempo, consegui juntar quase todas as peças necessárias. De inicio, ninguém acreditou que eu iria conseguir o meu objetivo, pouco dinheiro, ainda criança, e eu fui tocando o assunto pra frente.
Precisei dos serviços de uma bicicletaria para montar as rodas e o freio traseiro já que o dianteiro ainda não havia achado. Sempre contava com os amigos, que ajudavam em alguma coisa, um sabia pintar e dava as dicas, o outro montava os pneus, e assim a bicicleta ficou pronta. Exatamente pronta não estava, mas já dava para pedalar.
Que alegria. No primeiro dia sai de manhã e voltei á noite, junto com mais dois amigos, que possivelmente também tomaram uma bronca quando chegaram em casa.
Estávamos de férias na escola, pois ainda me lembro que passamos a semana passeando de bicicleta, todos os dias, o dia inteiro, só parávamos para almoçar, e dar uma passadinha em casa para falar oi, senão o bicho pegava.
A bicicleta era mesmo uma beleza, pintada de vermelho com um velho pincel, com detalhes em branco, verdadeiros borrões, com os pneus e os pedais, um diferente do outro, breque só mesmo o traseiro, o selim era velho de dar dó, mas não importava, era a minha bicicleta.
As férias se acabaram e a bicicleta ficou encostada, nos fundos de casa por alguns dias, talvez semanas, não me lembro, mas é certo que quando fui procura-la, não achei nem sinal. Tinham dado a minha bicicleta para alguem. De novo, depois de tantos anos, perdi mais uma bicicleta. Paciência, e o tempo passou.
Ai pelos anos 70 eu já era moço, e o assunto bicicleta voltou a chamar a atenção. Foi nessa época em que lançaram a famosa Caloi 10, bicicleta que marcou época, ainda sendo cultuada até hoje, e considerada uma das melhores fabricadas por aqui até hoje.
Mas com meus 20 anos, as minhas preocupações não eram bem as bicicletas, eu trabalhava e estudava e o meu tempo vago, saia com os amigos para os bailes nos clubes, festas da cerveja, que eram muitas naquela época, de modo que a Caloi 10 ficou em segundo plano por muito tempo, apesar de continuar fã do ciclismo, esporte que tinha ainda muitos adeptos.
Sempre apareciam noticias de corridas na França, Itália e etc. Tinha, em São Paulo, uma corrida muito famosa, hoje nem tanto, chamada 9 de julho que se dava pelas ruas da cidade, mas agora parece que foi para circuito fechado, perdendo muito do seu brilho.
O próprio ciclismo no decorrer dos anos foi perdendo força no Brasil, que com as cidades crescendo, e o transito cada vez mais perigoso, foi fatalmente desestimulando o uso das doces magrelas, companheiras fieis da nossa infância. Para nossa alegria, a chegada providencial dessa onda de pensamentos verdes, propagando idéias de conservação do meio ambiente, o ciclismo está voltando com tudo. De irmão mais pobre do transporte urbano, virou alternativa ecológica de transporte nas grandes cidades, faltando apenas mais atenção do Estado, para a construção de ciclovias, algo impensável anos atrás.
Essa idéia ecológica que nos trás de volta o ciclismo, é claro, mexe com os brios, principalmente, de quem já é aficionado pelo assunto, e depois de tanto anos, fui de novo, montar a minha bicicleta. Desta vez uma Caloi 10, que na minha mocidade deixei passar batido, e agora depois de tantos anos que saiu de fabricação, quero minha Caloi 10.
Comecei garimpado as bicicletarias próximas de casa, depois outras pelo caminho do trabalho, finalmente bicicletarias de outras cidades que eu acaso visitava, a trabalho ou a passeio.
Foi muito difícil encontrar algo que se aproveitasse e tivesse bom preço. Acabei encontrando uma bicicleta por um preço razoável. Dela eu aproveitei o que pude, o quadro, a catraca de cinco marchas, o cubo dianteiro Shimano de flange alta e o cambio dianteiro, peças originais e em bom estado. Pelas dificuldades, já dava para imaginar que não seria fácil a tarefa de montar uma Caloi original, como eu queria. Continuei no garimpo.
A parte mais interessante de se garimpar para achar as peças, é sem duvida as pessoas que se acaba conhecendo. É gente que obviamente , de alguma forma, está envolvida com o assunto, e ai você descobre que não é o ultimo da espécie em extinção, e que para se conhecer novas pessoas, basta ter os mesmos interesses. Não ha timidez que resista quando as pessoas descobrem que seus interesses são os mesmos.
Conheci pessoas que jamais esquecerei, me orientaram, ajudaram como puderam na minha empreitada, até peças difíceis como o cambio traseiro novo, eu consegui, e de presente. Contudo no garimpo nem sempre temos rosas no caminho, e para conseguir os breques originais, cujo preço o sujeito queria um absurdo, tive que comprar outra bicicleta para desmontar, só para aproveita os freios.Verdade que comprei a preço de banana, o que me possibilitou montar, de lambuja, uma segunda Caloi 10, com as peças que sobraram, que obviamente não ficou original como a primeira.
Algumas peças não são mais fabricadas e são difíceis de se encontrar, quando se encontra são usadas ou recuperadas e custam um bom dinheiro devido à raridade. Por isso é preciso garimpar, às vezes, comprar uma bicicleta inteira sai mais barato que a peça que se necessita.
Fiz muitos amigos e aproveitei muito do meu tempo livre. Bicicleta é mesmo uma cachaça, só não gosta quem não conhece.
Faltava ainda o cubo traseiro, difícil de se achar já que ele é o que mais quebra, quando se pegam buracos, e acabei encontrando no lugar que eu menos imaginava, na bicicletaria mais perto da minha casa. Foi ai mesmo que mandei montar as rodas, com raios de aço inox, e o restante da bicicleta com os cabos de aço e tudo mais.
O fundamental para a originalidade da bicicleta eu já tinha, que eram os câmbios, dianteiro e traseiro, o quadro que apesar ser de aço carbono, mais pesado, é o original, os freios de alumínio marca Dia Compe, e o cachimbo que segura o guidão, da mesma marca.
O restante das peças, troquei por outras, para deixar a magrela um pouco mais leve, que é o desejável nessas bicicletas tipo speed. Assim troquei o guidão, o pé de vela, os aros e os pedais, por peças novas de alumínio, o que não tirou o seu charme, pelo contrario, valorizou o que já era bonito. Quando a bicicleta foi para a montagem, a pintura já estava pronta, serviço que eu mesmo fiz em casa, com a ajuda de um pequeno compressor e um resto de tinta automobilística, que estava guardada há anos no armário de tralhas.
A bicicleta ficou linda, e logo acertei as regulagens necessárias como altura do selim, distancia do guidão, e fui. Feito uma criança com seu brinquedo novo.

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Quem é o Patinho Branco?

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Itanhaém, SP, Brazil
Formado em Administração, pescador de pesqueiro, palmeirense de quatro costados. Adoro os anos 70: tenho uma Caloi 10( são três na verdade), um fuca bala além de uma maquina fotografica Pentax Assay 35mm, só para curtir essa década maravilhosa. Cultivo uma pequena horta de temperos no quintal. Temos Manjericão do comum e do roxo, Alecrim, Hortelã, Salsinha, Cebolinha, orégano, Pimenta dedo de moça, malagueta e de cheiro. Gosto de estar com a familia, churrasquear e cozinhar, pedalar e bater papo com os amigos. Caminhar na praia é atividade obrigatória de todos os dias, quando o tempo ajuda.